ESTUPRO ou ESTRUPO?
Já faz um bom tempo que venho colecionando “casos” em que o Português está sendo “estrupado”. São situações nas quais o erro passa despercebido a muita gente boa. São casos em que jornalistas e até advogados desrespeitam o bom uso da nossa língua.
Podemos começar pelo “estrupo”. Além de mal escrito – o certo é ESTUPRO. (O texto original dizia que segundo a lei, ESTUPRO é só de mulheres. A Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, alterou a redação do artigo 213 do Código Penal e ampliou a relação para todos os gêneros. Veja a correção completa)
Crianças podem ser sequestradas. Como não há pedido de resgate, preferem dizer que elas foram “raptadas”. Há quem pense que, se não houver pedido de resgate, não há sequestro. Outro engano. Quando o sequestrador entra em contato com a família e exige alguma coisa em troca para libertar o sequestrado, temos um outro crime: a EXTORSÃO. Assim sendo, o que os jornais chamam de “sequestro”, na maioria das vezes trata-se de um sequestro seguido de extorsão ou extorsão mediante sequestro. Sequestrar é “tirar a liberdade de alguém ou alguma coisa”. É por isso que um bem pode ser sequestrado, ou seja, torna-se indisponível (seu dono não pode vendê-lo, por exemplo).
Confusões desse tipo são muito comuns. É interessante lembrar o velho caso do ROUBO e do FURTO. Só há roubo se houver algum tipo de “violência”. É comum as pessoas definirem os cleptomaníacos como “aqueles que têm a mania de roubar”. Mentira. O cleptomaníaco tem a mania de furtar. Em geral, ele não agride ninguém. O seu prazer é “pegar escondido”.
Outro caso antigo é a mistura de MANDADO e MANDATO. Não existe “mandato de segurança”. Toda ordem judicial é um MANDADO: “mandado de prisão”, “mandado de busca e apreensão”, “mandado de segurança”. MANDATO é “o poder de mando”, é “o período em que alguém está no poder”, é “a representação que o eleitor atribui ao candidato eleito”: “Cassaram o mandato do deputado”; “O mandato do presidente é de cinco anos”.
Temos outra “pedrada” jornalística quando alguém escreve: “Fulano entrou com uma liminar”. Ora, ninguém entra com liminar. Liminar é algo que se pede, e o juiz concede ou não. É a mesma história do “entrar com efeito suspensivo”. Isso é muito comum no meio esportivo. “Efeito” é consequência. Ninguém “entra” com efeito suspensivo. Mais uma vez é algo que se pede. O certo, portanto, é dizer que “se pediu efeito suspensivo”.
Agora, se você quer ver um juiz ficar “louco da vida”, é só dizer que ele “deu um parecer”. Quem dá parecer é consultor, perito, advogado… Juiz decide.
E, para terminar, a velha história da DENÚNCIA. Para quem não sabe, a verdadeira denúncia só pode ser feita pelo ministério público. Apenas o promotor pode apresentar uma denúncia. Rigorosamente, você não pode denunciar o seu vizinho porque ele bate na mulher. O cidadão comum acusa, revela… Nesse caso, nós não estamos falando de uma denúncia formal, pois na linguagem popular o uso do verbo DENUNCIAR já está consagrado. Na minha opinião, é um caminho sem volta. Depois do “disque-denúncia”, não tem mais jeito. Afinal, por que não inventaram o “disque-dedo-duro”?
Isso tudo comprova que muitas palavras de uso específico ou técnico passam a apresentar, na língua do dia a dia, um sentido mais amplo, mais genérico.
Correção: lei sobre crime de estupro
Agradeço aos atentos internautas que me alertaram sobre a mudança na lei sobre a configuração do crime de estupro. No post anterior deste blog escrevi que “segundo a lei, ESTUPRO é só de mulheres”. A Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, alterou a redação do artigo 213 do Código Penal e ampliou ampliou a criminalização do estupro para vítimas de todos os gêneros .
O texto original dizia “Constranger mulher, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Na mudança, foi retirada a palavra “mulher” e inserida a palavra “alguém”. Veja a íntegra da lei.
Já a configuração de rapto como crime foi revogada pela Lei nº 11.106, de 2005.
O post anterior foi corrigido.
HAJA VISTA ou HAJA VISTO?
Nossos leitores criticam o festival de HAJA VISTO: “Foi demitido haja visto o problema criado”; “Foi suspenso haja visto o seu mau comportamento”; “Deverá ser substituído haja visto seu desempenho no jogo de ontem”.
É…leitor não perdoa. E eles têm razão. O certo é HAJA VISTA.
Dica para ninguém esquecer:
HAJA VISTA significa “por causa de, devido a, uma vez que, visto que, já que, porque, tendo em vista”. O curioso é que, quando usamos o TENDO EM VISTA, ninguém diria “tendo em visto”. Então, não esqueça: HAJA VISTA = TENDO EM VISTA.
PATOLOGIAS ou DOENÇAS?
Médicos criticam o uso da palavra PATOLOGIA como sinônimo de “doença”: “O paciente apresenta várias patologias…”.
Concordo. Muita gente boa está esquecendo que LOGIA significa “estudo”. PATOLOGIA não é a “doença”, e sim o “estudo das doenças”.
Num texto menos formal, seria possível aceitar o uso de PATOLOGIA por “doença” como extensão de significado.
HAJAM ou AJAM?
A frase errada é: “Vai dar certo à medida que os articuladores hajam em torno do sucesso do governo e não usem suas funções para fortalecer segmentos partidários.”
O certo é: “…quem os articuladores ajam em torno do sucesso do governo…”
Na frase acima, devemos usar o presente do subjuntivo do verbo AGIR (=ajam), e não do verbo HAVER (=hajam).
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